Deputados estaduais de Mato Grosso do Sul apresentaram 210 projetos entre fevereiro e início de outubro, média de 8,75 matérias por parlamentar. Números que podem induzir as pessoas a acreditarem que a atual composição da Assembleia Legislativa tem produzido muito. Mas não é bem assim.
O MS em Brasília, com apoio de especialistas em matérias legislativas, analisou todas as 210 propostas e chegou à conclusão de que 57% delas (120) são inúteis, sem relevância para a sociedade sul-mato-grossense. Pior: muitos deles são considerados bizarros, absurdos e inócuos.
O MS em Brasília constatou grande número de propostas que dão nome de pessoas mortas a ginásios, creches, estradas e pontes, outras que incluem no calendário estadual festas religiosas, municipais e datas comemorativas sobre profissões ou eventos diversos. Prática comum a todos os deputados. São 67 propostas para atender as essas finalidades.
Das 210 matérias propostas no período, 21 foram sugestões de Marçal Filho (PSDB), seguido de João Henrique (PL) e Evander Vendramini (PP), com 19 projetos cada, Neno Razuk (PTB) e Antônio Vaz (PRB) com 14 e Capitão Contar (PSL) com 13. O veterano Londres Machado (PSD), recordista brasileiro em mandatos consecutivos como deputado estadual, foi o único dos 24 que não apresentou projeto.
Os melhores
O melhor desempenho é do Capitão Contar com 69,3% dos seus projetos tidos como “aceitáveis”. Das 13 matérias, quatro não fariam falta se deixassem de ser apresentadas, como as que inclui determinado assunto no calendário de eventos do Estado. Contar também sugere a divulgação da lista de pacientes em fila de espera por consultas, exames e cirurgias, sugestão inócua por não resolver o problema.
Em segundo, com melhor aproveitamento, está Vendramini com 68,3% dos projetos considerados apropriados. Isso não quer dizer, contudo, que todas essas proposições vão virar leis. O deputado também abusa na sugestão de matérias inúteis, como a inclusão de festas religiosas no calendário de eventos.
Vendramini também teve um dos seus projetos classificado como “inócuo”. Propôs a mudança de nome da “merenda escolar” para “alimentação escolar com critérios”, matéria que não acrescenta nada na melhoria da alimentação dos alunos da rede estadual de ensino.
Três deputados surgem na terceira posição com 66,6% de suas propostas “salvas” na avaliação do MS em Brasília: Professor Rinaldo (PSDB), Pedro Kemp e Cabo Almi, ambos do PT.
Os piores
Cinco dos 24 deputados tiveram 100% dos seus projetos considerados “irrelevantes” ou “inúteis”: Eduardo Rocha (MDB), Gerson Claro (PP), Herculano Borges (Solidariedade), Renato Câmara (MDB) e o presidente da Casa, Paulo Corrêa (PSDB). Lucas de Lima (Solidariedade) com 80% dos projetos reprovados e Antônio Vaz com 78,5% completam a lista.
Vaz, por exemplo, propôs 14 projetos, sendo 11 desnecessários. Em sete deles, o deputado pede a oficialização de datas comemorativas no calendário estadual. Outro projeto inútil dele é o que “autoriza o poder Executivo a oferecer aulas de defesa pessoal e artes marciais nas escolas estaduais”.
Já Lucas de Lima teve oito dos dez projetos “reprovados”. Um deles é o que obriga a identificar as bacias hidrográficas na conta de água. O deputado também pede a oficialização de festas e datas comemorativas no calendário estadual, como o “Dezembro Verde”, sobre o não abandono de animais, pegando carona na mania de colorir meses do ano para marcar o combate a determinada doença, o que não é o caso da proposta.
Bizarrices e inutilidades
Dezenas de projetos propostos entre fevereiro e início de outubro pelos deputados estaduais foram considerados “bizarros” e “inúteis” pelos especialistas ouvidos pelo MS em Brasília.
O deputado Lídio Lopes (PATRI), que teve 60% dos seus projetos reprovados, propôs o mais bizarro, segundo avaliação do site. Ele quer que animais domésticos tenham permissão para “visitação a pacientes” em hospitais públicos e privados. A visita a doentes deve seguir regras rigorosas até mesmo para humanos, como idosos e crianças, ou pessoas que estejam simplesmente gripadas.
Marçal Filho, por sua vez, defende a inclusão da “Peixada Dourados News” no calendário oficial de eventos do Estado. Dourados News é um site de notícias, o que levou os especialistas a considerarem o projeto “inútil”, ou “bizarro” por privilegiar empresa privada.
Apesar de ter tido apenas 33,3% dos seus projetos avaliados como inúteis, Cabo Almi propôs duas matérias bizarras. A que “dispõe sobre o direito de livre escolha, pelo consumidor, da oficina para realizar a revisão de veículo fora das autorizadas pelo fabricante” e outra que “obriga bares, restaurantes e casas noturnas a adotarem medidas de auxílio à mulher que se sinta em situação de risco”.
Já Felipe Orro (PSDB) apresentou nove projetos. Um deles obriga a construção do “banheiro família” nos estabelecimentos comerciais, matéria considerada inútil. Jamilson Name (PDT), que teve mais da metade de suas 11 matérias reprovadas, quer que a “costelada pantaneira” faça parte do calendário oficial do Estado.
Deputado de primeiro mandato, João Henrique (PL) resolveu comprar a briga dos assinantes de internet, telefone e TV. Apresentou dois projetos. Um que torna abusiva a cobrança do valor dos serviços “não prestados adequadamente” e outro que “obriga as operadoras a cancelarem a multa contratual de fidelidade”. Ambos considerados inúteis.
Em 27 de agosto, o MS em Brasília publicou reportagem sobre as propostas legislativas de senadores e deputados federais em 2019. O resultado foi bem parecido. Projetos de lei repetidos, confusos e inúteis (veja aqui).
Resumo, por ordem alfabética, sobre apresentação de projetos de lei de cada deputado
. Antônio Vaz (PRB)
14 projetos apresentados
11 projetos reprovados (78,5%)
. Barbosinha (DEM)
7 projetos apresentados
3 projetos reprovados (42,8%)
. Cabo Almi (PT)
9 projetos apresentados
4 projetos reprovados (33,3%)
. Capitão Contar (PSL)
13 projetos apresentados
4 projetos reprovados (30,7%)
. Coronel David (PSL)
6 projetos apresentados
4 projetos reprovados (66,6%)
. Eduardo Rocha (MDB)
2 projetos apresentados
2 reprovados (100%)
. Evander Vendramini (PP)
19 projetos apresentados
6 reprovados (31,7%)
. Felipe Orro (PSDB)
9 projetos apresentados
4 reprovados (44,4%)
. Gerson Claro (PP)
2 projetos apresentados
2 projetos reprovados (100%)
. Herculano Borges (Solidariedade)
3 projetos apresentados
3 projetos reprovados (100%)
. Jamilson Name (PDT)
11 projetos apresentados
6 projetos reprovados (54,5%)
. João Henrique (PL)
19 projetos apresentados
12 projetos reprovados (63%)
. Lídio Lopes (PATRI)
5 projetos apresentados
3 reprovados (60%)
. Londres Machado (PSD)
0 projeto apresentado
. Lucas de Lima (Solidariedade)
10 projetos apresentados
8 reprovados (80%)
. Marçal Filho (PSDB)
21 projetos apresentados
8 reprovados (38%)
. Márcio Fernandes (MDB)
8 projetos apresentados
4 projetos reprovados (50%)
. Neno Razuk (PTB)
14 projetos apresentados
6 projetos reprovados (42,8%)
. Onevan de Matos (PSDB)
2 projetos apresentados
1 projeto reprovado (50%)
. Paulo Corrêa (PSDB)
3 projetos apresentados
3 projetos reprovados (100%)
. Pedro Kemp (PT)
6 projetos apresentados
2 projetos reprovados (33,3%)
. Professor Rinaldo (PSDB)
9 projetos apresentados
3 projetos reprovados (33,3%)
. Renato Câmara (MDB)
7 projetos apresentados
7 projetos reprovados (100%)
. Zé Teixeira (DEM)
11 projetos apresentados
7 projetos reprovados (63,6%)
Nota da Redação 1 – Os projetos “reprovados”, na avaliação de especialistas consultados pelo MS em Brasília, são por vários motivos: bizarro, absurdo, inútil, obscuro, inócuo, incompetência para propor leis e invasão de competência privativa de outro poder. Qualquer parlamentar ou cidadão tem o direito de discordar da análise feita sobre a qualidade dos projetos.
Nota da Redação 2 – O site da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul é um dos piores para consultas variadas, com ferramentas e recursos ultrapassados.
É permitida a reprodução parcial ou total desta reportagem, desde que citada a fonte