CAMPO GRANDE
Chamado de “conversinha” pelos servidores e desmentido todos os dias nas redes sociais por moradores da periferia, o prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD), chega às últimas horas no cargo questionado por deixar herança maldita à vice-prefeita Adriane Lopes (Patriota). A expectativa é que ele renuncie sábado, 2 de abril.
O legado será uma cidade com obras paralisadas e outras intermináveis, rombo nas finanças e incapacidade da administração de gerar mais receitas, o que pode decretar insolvência pela falta de dinheiro para pagar despesas do dia a dia, como o próprio salário dos servidores (ver aqui).
“Abandono total. Unidades de saúde com falta de médicos e remédios, ruas sem asfalto e intransitáveis em dias de chuva, falta de escolas, ônibus lotados e sempre atrasados”, denuncia o “influenciador digital dos pobres” Bruno Ortiz Barbosa, 34 anos, morador do Bairro Leblon, região do Lagoa.
Com 23 mil seguidores nas redes sociais, Bruno Barbosa virou porta-voz de moradores de diversos bairros. Conta que, em 2019, começou a cobrar o prefeito Marquinhos Trad sobre as promessas não cumpridas, quando precisou do poder público e descobriu o quanto a periferia era esquecida.
Argumenta que o prefeito teria direito de renunciar ao cargo, se fosse deixar o município em boa situação financeira e administrativa, o que não irá ocorrer. “Teria todo o direito. Mas ele deixará a bomba no colo da vice-prefeita. Se for eleito governador, usará o dinheiro do Estado para cobrir os rombos que deixou na prefeitura”, alerta.
“A rua da casa da minha mãe é só poeira, mas aparece como asfaltada lá na prefeitura. O pai de um amigo enfartou e ficou três dias em uma Unidade de Pronto Atendimento, aguardando ser transferido. São problemas demais para quem mora distante do centro, onde tudo é mais fácil. Falta tudo na periferia em relação a serviços públicos”, avalia.
“Se for eleito governador, usará o dinheiro do Estado para cobrir os rombos que deixou na prefeitura” — Bruno Ortiz Barbosa
Fiscal dos gastos públicos, Bruno Barbosa diz que recebe várias denúncias diariamente. “Cobro as autoridades de maneira firme. Precisamos ser ouvidos. Recebemos diversas denúncias sobre descaso da prefeitura. Elas vêm de todas as partes da cidade. De posse da denúncia, vamos ao local, filmamos para comprovar o fato, ouvimos os moradores e postamos nas redes sociais”, explica.
O influenciador tem anotadas todas as promessas feitas e não cumpridas por Marquinhos Trad. Além do famoso compromisso de colocar ar-condicionado em todos os ônibus da cidade — que virou piada entre os moradores de Campo Grande — cita outros 12 assumidos por Trad nas duas eleições, de 2016 e de 2020 (ver lista):
- 1. Asfalto nos bairros Oliveira, União, Girassóis;
- 2. Aulas de inglês desde a 1ª serie;
- 3. Ampliar os projetos de esporte;
- 4. Transparência, com a criação do sistema unificado de prestação de contas municipal;
- 5. Centro de vendas em Anhanduí e área pública de lazer e esporte;
- 6. Retomada e construção de 11 escolas nos seguintes bairros: Popular, Anache, Talismã, Inápolis, Radialista, Oliveira lll, São Conrado e Serraville;
- 7. 2.800 casas populares do programa Moradia Social;
- 8. Revitalização da antiga rodoviária;
- 9. 100% LED nas vias públicas;
- 10. Reforma de todos os terminais de ônibus (com observação de que é contra porque o serviço deve ser feito pelo Consórcio Guaicurus);
- 11. Centro de atenção Psicossocial para dependentes químicos;
- 12. Centro de triagem para cães e gatos vítimas de maus tratos e unidade de pronto atendimento veterinário.
Bruno Ortiz Barbosa afirma que Campo Grande se transformou na cidade das obras abandonadas. Sustenta que a falta de transparência esconde o número exato de quantas obras estão paradas. “Só de escolas são 11 paradas, obras do córrego em frente ao Shopping Norte-Sul, pontos de ônibus nas avenidas Bandeirantes e Brilhante, terminais de ônibus desnecessários na Avenida Marechal Deodoro, entre outras”, relata.
Vereadores omissos
Faz duras críticas à atuação dos 29 vereadores de Campo Grande, segundo ele, encastelados em seus gabinetes, quando deveriam estar em contato constante com a comunidade para resolver os problemas que mais afetam as pessoas. “Representantes do povo apenas no papel. Na prática, não agem. Você reclama e eles nada fazem. Cansei de encaminhar pedidos à Câmara Municipal”, informa.
Acrescenta que ve a Câmara Municipal “omissa” em relação às atribuições para a qual foi criada, como ser fiscal das ações e atos do Executivo. “Não há fiscalização. Há troca de favores, como a nomeação de parentes e amigos em várias secretarias. Não enxergam os gastos públicos. Campo Grande está endividada, sem dinheiro e os vereadores nada veem”, completa.
Sobre a via-crúcis dos comerciantes da região central devido às obras, Bruno critica a falta de planejamento da prefeitura na execução dos serviços e da ausência de diálogo do prefeito com os comerciantes:
“Falta planejamento. Não teve o mínimo de cuidado com o empreendedor. Não fez um plano de isenção de impostos, incentivo ou investimentos para que os mesmos não fechassem. Muitos sonhos foram desfeitos nesses anos. Muitas lojas fechadas pelas obras no centro e pela pandemia tiveram que pagar impostos. Caos do início ao fim”, protesta.
“Os centros comunitários só servem hoje para cabides de emprego” — Bruno Ortiz Barbosa
Quando criança, lembra, fazia várias atividades promovidas pelos centros comunitários em parceria com a prefeitura. “Hoje, esses locais só servem como cabides de emprego e para ganhar votos”, denuncia o influenciador, que é formado em marketing e pós-graduado em Gestão Pública.
Afirma que o município abandonou vários programas que teriam mantido as crianças da periferia ocupadas. “Hoje, milhares de crianças estão abandonadas e expostas à criminalidade porque o poder público não oferece oportunidades para que elas estejam ocupadas com atividades sadias nessa fase da vida”, conclui Bruno Ortiz, casado e pai da Pérola.