BRASÍLIA
Campo Grande é a capital que mais gasta com pessoal, cuja despesa consome R$ 2,364 bilhões anuais, o equivalente a 59,16% das receitas do município. É o que revela levantamento feito com exclusividade pelo MS em Brasília com base em prévia fiscal do Tesouro Nacional.
O município ostenta outra marca negativa: é uma das duas únicas capitais que estouraram o limite de gasto com funcionalismo, de 54%, determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A outra capital é João Pessoa (PB), com 58,26%. Os dados se referem ao último quadrimestre de 2021.
Os números indicam que a gestão do então prefeito Marquinhos Trad (PSD), que renunciou em 1º de abril para disputar o Governo, fechou 2021 gastando R$ 2,364 bilhões com pessoal. Esse dinheiro representa 59,16% da receita corrente líquida do município, que atingiu R$ 3,996 bilhões ano passado.
Com isso, Campo Grande estourou em mais de cinco pontos percentuais o limite determinado pela LRF, de 54%, para os municípios. Em valores, a Prefeitura gastou R$ 207 milhões a mais que o permitido e R$ 310 milhões a mais em relação ao “limite prudencial”, de 51,30%, da receita líquida.
Se utilizar como base o “limite de alerta”, 48,60%, o montante de dinheiro a mais usado para pagar servidores concursados e comissionados (nomeados politicamente) atinge a expressiva cifra de R$ 422 milhões, descalabro financeiro em qualquer gestão.
Os recursos gastos a mais com pessoal — que, em 2021 variaram de R$ 207 milhões a R$ 422 milhões — foram tirados de outras áreas, como da saúde. O abastecimento das unidades de saúde com remédios e insumos e a conclusão de obras e reformas diversas, como de escolas e creches, foram comprometidos.
Vai piorar
A tendência, conforme projeções feitas pelo MS em Brasília com base nos dados fornecidos pela Prefeitura ao Tesouro Nacional, é que a situação da capital sul-mato-grossense se agrave ainda mais a partir de maio.
É quando o município divulgará o resultado do primeiro quadrimestre de 2022 (janeiro a abril) em que a despesa com pessoal trará números atualizados em decorrência do aumento salarial concedido aos servidores pelo ex-prefeito Trad.
Fato é que a prefeita Adriane Lopes (Patriota) terá de começar a reduzir o excesso a partir de 2023, conforme determina a Lei Complementar 178, de 2021. O artigo 15 dessa norma diz que, “o órgão que estiver acima do limite estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, deverá eliminar o excesso à razão de, pelo menos, 10% a cada exercício a partir de 2023”.
Significa que, além de não poder comprometer mais a receita com a folha — dar aumento, contratar ou fazer nomeações políticas — a prefeita terá que demitir comissionados, reduzir valores de cargos e funções, além de diminuir a jornada de trabalho com consequente queda nos vencimentos.
Gravidade
A situação de Campo Grande é tão grave que somente outra Capital, João Pessoa, descumpre o limite de comprometimento de receitas, com 58,26%. As demais capitais têm o quadro entre regular e bom no que se refere a gasto com pessoal (ver ranking completo abaixo).
A terceira capital com mais despesas nesse item é Porto Velho com 50,32%, nove pontos percentuais a menos em relação a Campo Grande, por exemplo. A capital de Rondônia é seguida de Palmas (TO), com 49,32% da receita corrente líquida usada para pagar o funcionalismo. Maceió (AL) aparece em quinto lugar, com 48,98% de gastos com pessoal.
A capital São Paulo é a que menos compromete suas finanças com o pagamento do funcionalismo, com 30,62%, quase 30 pontos percentuais abaixo em relação a Campo Grande. O segundo menor gasto é Salvador (BA) com 34,98%. Em terceiro lugar aparece Belo Horizonte (MG) com 37,94% da receita líquida com pessoal.
Gestões desastrosas
A falta de capacidade de investimento próprio em obras, projetos, programas sociais, ações nas áreas de saúde e educação de Campo Grande é reflexo do desleixo com que a Capital sul-mato-grossense foi administrada nos últimos nove anos, entre 2013 e 2021.
Foram quatro anos de problemas administrativos e políticos com o então prefeito Alcides Bernal (PP) e depois com o vice Gilmar Olarte (sem partido), entre 2013 e 2016. Bernal foi cassado, mas retornou ao cargo um ano e cinco meses depois, enquanto Olarte foi afastado. Ambos foram condenados por improbidade administrativa.
O sucessor da dupla, Marquinhos Trad (PSD), escolheu administrar a cidade com pitadas de populismo. Investiu grande parte dos recursos disponíveis em ações de tapa-buracos e recapeamento de ruas, especialmente na região central, com abandono dos bairros.
Para fazer frente ao movimento populista, inchou a máquina municipal com funcionários nomeados politicamente, causando o estouro do limite de gasto com pessoal. A irresponsabilidade administrativa terá de começar a ser corrigida a partir de 2023, segundo a Lei Complementar 178, de 2021.
A prefeita Adriane Lopes foi procurada para explicar a situação dos gastos do município com pessoal, mas não respondeu aos questionamentos encaminhados a sua assessoria às 8h37 de ontem (quarta-feira).