CAMPO GRANDE
A principal testemunha de Marquinhos Trad (PSD) de que seria vítima de armação política sobre as acusações de crimes sexuais não é figura desconhecida do ex-prefeito de Campo Grande, candidato ao Governo do Estado. Réu e testemunha têm estado próximos há pelo menos oito anos.
As denúncias de assédio sexual, importunação, estupro, tentativa de estupro e incentivo à prostituição contra Marquinhos foram divulgadas em 20 de julho pelo site Metrópoles, de Brasília. Das 15 acusações investigadas pela Polícia Civil em Campo Grrande, a Justiça mandou arquivar seis, a maioria devido à prescrição dos supostos crimes.
Em pelo menos três dos 10 casos analisados pela juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, da 3ª Vara Criminal de Campo Grande (ver aqui), há indícios de que Marquinhos Trad se aproveitou da condição de vulnerabilidade social das mulheres para ter sexo em troca de vantagens diversas, como inclusão em programas sociais e cargos na prefeitura.
“Testemunha-chave”
Em coletiva de imprensa concedida sexta-feira (9) pelas advogadas do ex-prefeito Andréa Flores e Rejane Alves de Arruda, em Campo Grande, foi anunciada “testemunha-chave”, segundo a defesa, que desnudaria a farsa contra seu cliente. Trata-se de Elenilton Dutra de Andrade, 53 anos, ora citado como pecuarista, ora como empresário, ora como servidor público.
Elenilton, no entanto, possui extensa ficha criminal. São vários processos, como extorsão, estelionato, falsidade ideológica, formação de quadrilha ou bando, contrabando e descaminho, entre outros.
Em outubro de 2018, Elenilton foi denunciado por injúria à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, coincidentemente a mesma que investiga as denúncias contra Marquinhos Trad. Uma mulher que teria trabalhado na campanha dele a deputado estadual foi chamada de “lixo, vagabunda, traidora” em mensagem de voz pelo aplicativo WhatsApp (ver aqui).
Em um dos processos, Elenilton foi defendido por Fábio Trad (PSD), deputado federal e advogado, irmão de Marquinhos Trad (ver procuração). A dita testemunha respondeu a processo por extorsão e formação de quadrilha ou bando em 2016 contra um empresário de Campo Grande. A denúncia foi proposta pelo Ministério Público Estadual.
As coincidências se sucedem. Elenilton é assessor especial da Prefeitura de Campo Grande, nomeado em 19 de janeiro de 2021 pelo então prefeito (ver cópia do decreto). É lotado na Secretaria Municipal de Governo e Relações Institucionais e recebe salário de R$ 10.098,90. Em 2018, foi candidato a deputado estadual pelo Patriota, partido da atual prefeita Adriane Lopes. Teve 1.279 votos.
O MS em Brasília apurou que a testemunha mantém contatos com a família Trad há pelo menos oito anos. Em nota publicada no Blog do jornalista Marco Eusébio, em 2 de julho de 2014, Elenilton conta os motivos que o levaram a abandonar o deputado federal Dagoberto Nogueira (PSDB), à época no PDT, para apoiar os irmãos Fábio a deputado federal e Marquinhos a estadual (ver aqui).
Cooptação
Na coletiva da semana passada, as advogadas descreveram como teria ocorrido a suposta tentativa do secretário estadual Carlos Alberto de Assis de cooptar Elenilton para participar de farsa a fim de incriminar o ex-prefeito. A primeira oferta teria sido de R$ 300 mil, recusada pelo servidor municipal. Houve uma segunda proposta, dessa vez de R$ 400 mil, também negada.
As advogadas informaram, na ocasião, que seu cliente havia entrado com ação por “denunciação caluniosa” contra Assis, com base nos relatos do controverso Elenilton.
O MS em Brasília procurou o deputado federal Fábio Trad, que advogou para Elenilton, principal testemunha do irmão Marquinhos Trad. Explicou, por meio de sua assessoria, que a advogada da testemunha é Nabiha Maksoud. Informado de que a defesa dele teria ocorrido em 2016, respondeu que “ele foi e não é mais”.
Ao MS em Brasília, Elenilton considerou irrelevante ter ações criminais. “Você pode ter 1.000 ações e ser inocentado em todas”, declarou. Afirmou que é “simples testemunha”, que as provas contra Assis foram entregues à polícia e que a ação corre em segredo de justiça.
Não quis responder sobre suas relações com a família Trad nem sobre se Fábio Trad foi seu advogado em um dos processos.
Megaprodução
A entrevista das advogadas Andréa Flores e Rejane Alves Arruda foi bem planejada, com ares de megaprodução. As profissionais foram treinadas para falar o tempo todo para uma câmera e não para os jornalistas, que serviram apenas de plateia para o “espetáculo”.
A coletiva foi organizada pela ex-repórter da TV Globo em São Paulo Carla Modena, certamente contratada para administrar a crise em torno da campanha de Marquinhos Trad.
Um dia depois, foram divulgados vídeos no WhatsApp com as declarações de ambas as advogadas, editadas para transmitir a ideia de que as acusações contra o candidato ao governo foram montadas pelos adversários.
O MS em Brasília procurou a assessoria do candidato para saber sobre a contratação de Modena e qual o papel da ex-Globo em uma entrevista de advogadas particulares de Trad, mas não houve resposta.