ALEXSANDRO NOGUEIRA (*)
Qual o pior livro da minha vida? Difícil resposta. Nesses meus 50 anos já foram tantas as obras, tantas desistências e decepções que às vezes tenho vontade de revisitar tudo para ver se mudo de opinião. Começaria revendo os romances de Chico Buarque que costuma transitar pelo ofício de escritor, mas converge seus impulsos literários em uma descida alucinante à banalidade.
Talvez, eu passaria os olhos novamente sem o mesmo rigor pelas páginas de “Budapeste” e “Estorvo”, demonstrando a resiliência como uma das minhas maiores virtudes. É difícil não gostar de um mito nacional mimado pela crítica, uma celebridade de esquerda, mas chato e tedioso enquanto romancista. Felizmente a ruindade de seus livros não contaminou suas melodias e ele pode seguir adiante. Acrescento ainda mais uma polêmica ao tema ‘poetas da canção brasileira’, qual os grupos culturais fogem do assunto: “MPB não é poesia. No Brasil ou em qualquer lugar do mundo”.
É difícil não gostar de um mito nacional mimado pela crítica, uma celebridade de esquerda, mas chato e tedioso enquanto romancista
Quase ao mesmo tempo em que desisti de Chico, caí na tentação de farfalhar os versos de Federico Garcia Lorca. Espiei por alto o poeta espanhol e não consegui ir além dos trechos iniciais. As páginas me pareceram indigestas. Explico: Lorca deixou uma obra vistosa, mas até certo ponto borrada pela iniciativa de contrabandear política pela veia poética. No final das contas, bagunçou seu recurso estilístico com metáforas e as contradições entre opressão e liberdade. Não tinha que ser assim, mas foi assim.
Mas existe uma terceira espécie de escritor. Aquele que tem a pretensão de mudar os homens e as coisas e acha que sua obra tem a missão de redimir a humanidade dos seus erros. Exemplos? Uns tantos, mas o maior deles talvez seja o português José Saramago com o romance “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”, um grande tema, mas tratado pelo autor de maneira simplória, obscura e covarde.
Mas existe uma terceira espécie de escritor. Aquele que tem a pretensão de mudar os homens e as coisas e acha que sua obra tem a missão de redimir a humanidade dos seus erros
Como boa parte dos eruditos, Saramago tinha certa dificuldade em compreender a finitude da vida e a relação do tema com o Cristianismo. Um mergulho superficial na obra do prestigiado escritor lusitano, permite aos leitores o discernimento de que Saramago viveu amaldiçoando contra todos aqueles que optaram pela religião como escolha racional. Reconheço o direito ao ateísmo, de quem só comunga fé nos homens e na ciência, mas uma cruzada ideológica contra Deus, fiéis e igreja, chega ser uma neurose, um tipo de tara existencial.
Também compreendo que não é fácil escrever um texto profundo, falando sobre a relação do Cristianismo com os acordes finais da vida, com a percepção de C.S Lewis e G.K. Chesterton. Saramago não desenvolveu esse tipo de sensibilidade, sobretudo, porque tinha o vício da arrogância intelectual, comum a muitos escritores que acreditam que vieram ao mundo para ensinar algo a alguém por meio de seus ensaios.
Como boa parte dos eruditos, Saramago tinha certa dificuldade em compreender a finitude da vida e a relação do tema com o Cristianismo
Só vim a entender (um pouco mais tarde) que os livros de Chico e Saramago são demonstrações claras de boçalidade literária. A eles se juntam um tanto outros autores que gostam de opinar sobre meio ambiente, política e religião, travestidos de consciência social. Felizmente, ninguém os leva a sério, até porque são artistas, né?
Não se trata apenas de uma abordagem pessimista a respeito dos novos tempos, mas uma teoria sobre miséria cultural e a vulgaridade antirreligiosa que toma conta do mundo e que não vai passar assim tão rapidamente.
(*) É jornalista em Campo Grande