FLÁVIO SOUZA, DE BRASÍLIA
Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) constatou falhas nos serviços de dragagem (técnica usada para limpeza de rios) na hidrovia do Rio Paraguai, nos trechos entre Cáceres, em Mato Grosso, e Corumbá, em Mato Grosso do Sul, numa extensão de 680 quilômetros.
A equipe especializada em infraestrutura portuária e ferroviária do tribunal considerou frágeis os levantamentos hidrográficos, cuja medição da temperatura da água é feita com termômetro manual. As constatações ocorreram após trabalhos desenvolvidos entre 17 de abril e 30 de junho deste ano.
O relatório de auditoria foi aprovado pelo plenário do tribunal em final de outubro e publicado semana passada. De acordo com o TCU, a fiscalização teve como motivo o alto valor dos recursos públicos utilizados na dragagem do Rio Paraguai.
Há quatro contratos em vigor para os próximos cinco anos, totalizando R$ 107.312.967,72, para manutenção, desobstrução de vegetação e adequação da sinalização do canal navegável. No entanto, não foram encontradas irregularidades em relação a sobrepreço dos serviços contratados.
O tribunal concluiu que há falha no trabalho de medições das réguas. Além das réguas oficiais, cujos resultados podem ser consultados diariamente pelo site da Marinha, são utilizadas réguas não oficiais. Elas são lidas diariamente por moradores locais, pagos para executarem o serviço.
“Tais medições são utilizadas diretamente como fator de correção ao final do cálculo e podem distorcer o levantamento hidrográfico técnico realizado através de batimetrias”, observa o relator do processo no TCU, ministro Augusto Nardes.
Ouvir usuários
O TCU identificou ainda a falta de canal de comunicação do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes ) com os usuários da hidrovia, que permita o controle público da navegação no Rio Paraguai. Segundo o tribunal, o órgão adota procedimento de receber comunicações através de contatos diretos das pessoas que usam a hidrovia.
“Isso pode fazer com que usuários, uma das principais fontes de dados quanto à situação encontrada ao longo do canal hidroviário, deixem de prestar informações que seriam relevantes ao gestor dos contratos da hidrovia”, avalia o relator.
Nas diligências feitas ao longo da hidrovia, segundo o TCU, foram localizados desafios à navegação em determinados trechos, em razão da existência de bancos de areias e curvas com raios de curvatura mínimos nos canais de tráfego. “Assim, previu-se a execução dos serviços de dragagem no período de vazante do rio, entre os meses de maio e outubro, podendo ser estendido até o mês de novembro”, explica o relatório.
O relator continua: “Foi verificada também grande quantidade de vegetação flutuante levadas pelas águas, como aguapés, galhadas, formando “balseiros”, sob a forma de tufos isolados ou aglomerados, causando paradas sucessivas para limpeza dos detritos vegetais acumulados nos sistemas propulsores das embarcações”.
O ministro Augusto Nardes destaca que a fiscalização resultará em benefícios à hidrovia, como melhoria na gestão e fiscalização de editais e contratos
Na decisão, o tribunal esclarece que a desobstrução da vegetação superficial será feita com a passagem de rebocador em meio às ilhas de plantas aquáticas, com apoio de barcos pequenos. “A vegetação será dispersa pela passagem da embarcação e não será removida do leito do rio. O serviço será realizado especialmente no período de cheia, sempre que necessário”, recomenda.
Tráfego reduzido
O tribunal aponta ainda o “inexpressivo” tráfego de transporte comercial de cargas entre Cáceres e Corumbá, chamado de Tramo Norte: “O Dnit pontuou que a ausência de movimentação de cargas no Tramo Norte está relacionada com as estruturas portuárias nesse trecho da hidrovia que, até o momento da elaboração dos estudos e do último plano de dragagem, não haviam entrado em operação”.
Ao TCU, o Dnit explicou que há previsão de instalação de terminais de uso privado no Tramo Norte, nas regiões de Barranco Vermelho, Paratudal e Paraíso, além da reativação do Porto de Cáceres para retomada do transporte fluvial.
O ministro Augusto Nardes destaca que a fiscalização resultará em benefícios à hidrovia, como melhoria na gestão e fiscalização de editais e contratos no Dnit.
Importância da hidrovia
A parte brasileira da Hidrovia Paraguai-Paraná começa em Cáceres, chega a Corumbá e vai até o rio Apa, no município de Porto Murtinho, em Mato Grosso do Sul, numa extensão de 1.270 km.
Ao apurar a aplicação de recursos nos serviços de dragagem, o Tribunal argumenta que “o canal navegável do rio Paraguai é um dos mais extensos e importantes eixos de integração política, social e econômica da América do Sul”.
A hidrovia tem papel de oferecer alternativa de transporte de passageiros e de cargas em grandes volumes, incluindo produtos agrícolas, minerais, combustíveis e produtos manufaturados, com menor custo em comparação com outros modais, como o rodoviário e o ferroviário.