EMANUEL ALMEIDA, BRASÍLIA
O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga a compra de 29 veículos blindados para operações especiais da Polícia Rodoviária Federal (PRF) entre 2020 e 2021, durante a pandemia da Covid-19 no Brasil. Resultado preliminar de auditoria foi publicado semana passada.
O trabalho alcança quatro pregões realizados pela PRF e pelo Ministério da Defesa em pelo menos cinco Estados (RJ, PR, MS, RN e DF), no valor de R$ 47,4 milhões. Desse total, R$ 1.600.694,99 foi utilizado em 23/12/2021 na compra de dois veículos blindados para operações especiais da PRF em Mato Grosso do Sul.
Os pregões do Governo federal, de acordo com auditoria do tribunal, foram vencidos pela empresa Combat Armor Defense do Brasil Ltda, criada em 2019 nos Estados Unidos.
As compras teriam sido articuladas pelo então superintendente da PRF no Rio de Janeiro, Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da corporação, indiciado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos de 8 de Janeiro.
Favorecimento
A auditoria teve objetivo de identificar indícios de favorecimento ou direcionamento dos certames à empresa, bem como de sobrepreço ou superfaturamento, por meio da análise de elementos como cláusulas excessivamente restritivas, classificações ou desclassificações indevidas.
A suspeita é que os pregões tenham sido direcionados à Combat, criada em 2011 com o nome ‘Ad Faction, Inc.’, no estado americano de Idaho. No ato de abertura, a atividade econômica principal declarada consistia na atuação no ramo de publicidade.
O TCU apurou que, entre 2013 e 2018, a empresa não enviou o relatório anual de atividades exigido, demonstrando que permaneceu inativa por seis anos.
“Sete anos após envio do último relatório anual, em 17/1/2019, a empresa protocola um pedido de reintegração, mudando o nome para ‘Combat Armor Defense, Inc’. Poucos dias depois, em 29/1/2019, a atividade econômica da empresa é alterada para viabilizar operações no Brasil”, descreve o relatório do TCU.
Embora a Combat tenha apresentado declarações sobre sua atuação no mercado de blindados, técnicos do tribunal não encontraram “qualquer resultado que indique uma atuação da companhia americana no mercado de blindados ou afins”.
Empresa de ‘papel’
O TCU entende que “há indícios de que a Combat Armor americana se trata de uma empresa de ‘papel’, sem qualquer atuação no ramo de blindados, cujo propósito da reativação e alteração do seu contrato social foi viabilizar negócios no Brasil”.
No final de 2022, a empresa recebeu R$ 38.928.136,25 da União, dos quais, R$ 33.552.141,25 pagos pela Polícia Rodoviária Federal, R$ 2.968.000,00 pela Polícia Federal e R$ 273.000,00 pelo Ministério da Defesa.
A empresa, segundo o TCU, encerrou as atividades no primeiro semestre de 2023, após a troca no Governo federal, deixando de cumprir contratos firmados com a Polícia Rodoviária Federal e outros órgãos.
O relator do caso destaca que os três processos investigados foram executados ao longo de 2020, período em que o Brasil atravessava a mais grave crise sanitária da história.
“Portanto, esses certames para a aquisição de veículos blindados e serviços correlatos à blindagem foram considerados convenientes e oportunos pelo então superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Rio de Janeiro, Silvinei Vasques, durante a pandemia”, observa o relator do processo no TCU, ministro Jhonatan de Jesus.
Diante das irregularidades constatadas preliminarmente, o tribunal decidiu prorrogar o prazo da auditoria por mais 90 dias. Além disso, deu prazo de 15 dias para que a PRF encaminhe levantamento “abrangente” de todos os veículos adquiridos.
Outro lado
Procurada ontem (8) pelo MS em Brasília, a Superintendência da PRF em Mato Grosso do Sul encaminhou a demanda para Brasília, que não respondeu até o fechamento desta matéria.
Preso desde ano passado acusado de interferir nas eleições em 2022, Silvinei Vasques disse, em nota distribuída à imprensa, que “nunca teve participação direta nas licitações” e que “nunca teve o dever de vigilância sobre esses procedimentos licitatórios”.
A PF informou que a Combat prestou serviço de blindagem em viaturas do órgão e que investiga a denúncia desde 2023.