(*) ROSILDO BARCELLOS
A vida não é uma mera sucessão de fatos e acontecimentos. Rememorei a “Retirada da Laguna” e comparei com os nossos problemas atuais. A coluna brasileira, percorreu em dois anos 2.112 km a pé. Atravessando o Pantanal, a coluna chegou a Miranda, saqueada e incendiada.
Em Miranda, no primeiro do ano de 1867 o Coronel Carlos de Morais Camisão assumiu o comando das tropas que marchou até Nioaque, seguindo logo após, até a fazenda chamada Jardim às margens do rio Miranda.
A fazenda era propriedade de Francisco José Lopes, uma das personagens mais interessantes deste contexto, posto que ele era um criador de gado que na ocasião cuidava de terras em nome do Imperador D. Pedro II, e que nutria grande aversão pelos paraguaios que lhe tinha morto o irmão e sequestrado o filho e a cunhada, sua futura esposa.
Lopes propôs guiar a tropa brasileira por aquele sertão ser conhecedor e ainda fornecer alimentação aos soldados. A tropa chegou a Bela Vista, às margens do Apa, que então era território paraguaio e foi até a fazenda Laguna, do ditador paraguaio Solano López.
Momento em que, cercada pelos paraguaios, sem víveres e com pouca munição decidiu bater em retirada. Os paraguaios usavam sua cavalaria contra os brasileiros que seguiam a pé. Camisão morreu de cólera no fim da retirada, já às margens do Miranda, assim como Lopes e seu filho, onde hoje é a cidade de Jardim. A margem oposta hoje abriga a cidade de Guia Lopes da Laguna e dos 1.680 soldados que invadiram o Paraguai em abril de 1867, 700 voltaram a Porto Canuto em Anastácio/MS.
Essas informações estão no livro célebre, do Visconde de Taunay, relato loquaz de tudo o que ocorreu com a expedição. O autor escreve no Prólogo: ‘É o assunto deste volume a série de provocações por que passou a expedição brasileira, em operações ao Sul de Mato Grosso, no recuo efetuado desde a Laguna, a três léguas e meia, do rio Apa, fronteira do Paraguai, até as margens do rio Aquidauana, hoje Anastácio, Mato Grosso do Sul.
O marco simbólico do fim da retirada, episódio da Guerra da Tríplice Aliança, é uma rocha de arenito, na fazenda Tabapuan, aonde está fixada uma placa reproduzindo o último parágrafo do boletim militar (ordem do dia) referente a 12 de junho, um dia após a chegada no Porto Canuto, escrito pelo Tenente Escragnolle (Alfredo Maria Adriano d’Escragnolle Taunay):
“A retirada, soldados, que acabais de efetuar, fez-se em boa ordem, ainda que no meio das circunstâncias as mais difíceis. Sem cavalaria contra o inimigo audaz que a possuía formidável, em campos onde o incêndio da macega, continuamente aceso, ameaçava devorar-vos e vos disputava o ar respirável, extenuado pela fome, dizimados pela cólera que vos roubou em dois dias o vosso comandante, o seu substituto e ambos os vossos guias, todos estes males, todos estes desastres vós os suportastes numa inversão de estações sem exemplo, debaixo de chuvas torrenciais, no meio de tormentas de imensas inundações, em tal desorganização da natureza que parecia contra vós conspirar. Soldados! Honra a vossa constância, que conservou ao Império os nossos canhões e as nossas bandeiras!”.
(*) É escritor, conteudista, contista, compositor, articulista e poeta