LARISSA ARRUDA, DE BRASÍLIA
O juiz Cleber de Andrade Pinto, da 16ª Vara Cível de Brasília, negou terça-feira (17) liminar em que a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) pede direito de resposta em publicação do MS em Brasília a respeito de lobby feito por ela pela liberação do consumo do cigarro eletrônico no Brasil.
Essa possibilidade passou a ser possível depois que a senadora apresentou o Projeto de Lei 5.008/2023. O texto prevê a liberação da produção, importação, exportação, comercialização, controle, fiscalização e propaganda dos cigarros eletrônicos no Brasil.
Em 20 de setembro deste ano, o site postou vídeo nos stories do seu perfil no Instagram sobre o risco do cigarro eletrônico, com a seguinte mensagem: “Cigarro eletrônico, o veneno que a senadora Soraya Thronicke quer liberar no Brasil”.
Em 20 de setembro deste ano, o site postou vídeo nos stories do seu perfil no Instagram sobre o risco do cigarro eletrônico
Em mensagem encaminhada ao MS em Brasília no mesmo dia, a senadora pediu a “retirada urgente” da postagem. Na ação, contudo, ela diz ter pedido a “readequação da postagem”, o que não é verdade. Em resposta, o site explicou que não havia distorção, razão pela qual a publicação estava mantida.
Na semana passada, a senadora acionou a Justiça do Distrito Federal com pedido de liminar para obter direito de resposta, alegando que a publicação tem conteúdo difamatório. Antes, ela havia acionado extrajudicialmente a Advocacia do Senado.
A defesa
Em sua defesa, o MS em Brasília afirma que, ao contrário do que tenta fazer crer a senadora, em todo material divulgado pelo site sobre o projeto de lei nº 5.008/2023, não há qualquer desinformação, inverdades ou ofensas à senadora Soraya Thronicke, ou a qualquer membro do Congresso Nacional.
“Ao propor tal projeto, devia se saber que haveria alta rejeição, uma vez que o Brasil lutou por vários anos contra o cigarro comum e, com muito custo, conseguiu reduzir o consumo. Logo, compete a cada um julgar a intenção do texto legislativo, especialmente a um site de notícias, cuja liberdade de expressão é matéria expressa na Constituição”, destacou a defesa do veículo, feita por Alcides Gomes Advogados, de Campo Grande.
“Ao propor tal projeto, devia se saber que haveria alta rejeição, uma vez que o Brasil lutou por vários anos contra o cigarro comum e, com muito custo, conseguiu reduzir o consumo” — Trecho da defesa
Argumentou ainda que o MS em Brasília sempre se guiou por posicionamentos de 80 entidades médicas e profissionais especializados em doenças causadas pelo tabagismo. E que sempre colocou o ponto de vista da senadora, “por meio da exposição de motivos contida na proposta legislativa, ou extraído de postagem dela nas redes sociais, ou mesmo de debates online sobre o tema”.
Decisão da Anvisa
A contestação traz ainda parte da decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), tomada em 19 de abril de 2024, que rejeitou a produção, importação, exportação, comercialização, controle, fiscalização e propaganda dos cigarros eletrônicos no país.
A defesa levou ainda à Justiça uma série de material que aponta risco à saúde pública do país, caso o Senado aprove o projeto da senadora Soraya Thronicke. Entre elas, artigo assinado por diversos ex-ministros da Saúde contra o texto legislativo.
A defesa levou ainda à Justiça uma série de provas que aponta risco à saúde pública do país, caso o Senado aprove o projeto
Entre tantos argumentos, fez menção à reportagem da revista Piauí, publicada semana passada, segundo a qual a senadora Soraya Thronicke viajou à Itália em maio de 2024 com as despesas pagas pela Philip Morris (ver aqui), uma das maiores fabricantes de cigarros do mundo.
Liminar negada
Ao negar a liminar, o magistrado cita o artigo 220 da Constituição: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.
Reforça que a Constituição protege, tanto o direito à informação, quanto a intimidade e imagem dos cidadãos. “No presente caso, não se verifica conteúdo difamatório nas reportagens questionada pela autora”, aponta o juiz.
“No presente caso, não se verifica conteúdo difamatório nas reportagens questionada pela autora” — Juiz Cleber de Andrade Pinto
Acrescenta que, em que pese a existência do conteúdo crítico nas reportagens, tais críticas não ultrapassam, inicialmente, os limites da liberdade de expressão e da atuação jornalística como um dos pilares do Estado Democrático de Direito.
“Conforme narrado pela própria autora, esta defende o projeto de lei em comento, sendo que as reportagens criticam justamente a defesa a uma legislação que, segundo opinião crítica da reportagem, é danosa à saúde dos cidadãos brasileiros”, destaca.
“Tais críticas não ultrapassam, inicialmente, os limites da liberdade de expressão”
Reforça que, sem conteúdo difamatório, “é incabível a retirada da matéria do ar, sobretudo, em sede de tutela de urgência, sob pena de grave violação à liberdade de expressão e ao exercício do trabalho jornalístico”.
Ao concluir sua decisão, o juiz Cleber de Andrade Pinto critica a postura da senadora Soraya Thronicke por ter buscado abrigo no Judiciário, quando as contestações às críticas ao projeto deveriam ser feitas na própria esfera política.
A senadora pode apresentar suas razões no prazo de três dias.