O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, mandou suspender a decisão da Justiça do Rio de Janeiro que havia proibido, dois dias atrás, que o canal de humor Porta dos Fundos exibisse um vídeo sobre Jesus. Em sua opinião, os humoristas estariam ofendendo os fiéis da religião católica — e isso não estaria protegido pelo direito da livre expressão.
Muita gente, com certeza, ficou revoltada com o vídeo, convencida de que a fé religiosa, com seus personagens de culto, não pode ser objeto de piada. Mas a lei não diz nada disso. Diz apenas que todo cidadão tem direito à liberdade de dizer o que quiser.
Se cometer algum delito ao fazer isso, como os crimes de calúnia, injúria ou difamação, por exemplo, estará sujeito a processo penal e cível, é claro. Mas não pode ser proibido de se manifestar. Muito correto.
Não existe censura legal no Brasil, e a Justiça não pode censurar ninguém. É curioso notar, apenas, que quando esse mesmo STF mandou censurar (os ministros dizem que não foi bem isso, mas foi) a revista Crusoé, publicada pelo site O Antagonista, a esquerda, que ficou tão escandalizada com o caso Porta dos Fundos, não deu um pio em defesa da liberdade de expressão.
Mais: quando a redação do jornal de humor Charles Hebdo, em Paris, foi invadida por dois “militantes” muçulmanos que assassinaram à bala 12 jornalistas, exatamente cinco anos atrás, a reação do universo esquerdista foi toda cheia de cuidados e rapapés com o crime.
O jornal, como se sabe, tinha publicado uma charge satírica sobre Maomé, algo do mesmo gênero do vídeo sobre Jesus —, mas, os combatentes da liberdade de expressão no Brasil disseram que as vítimas não deveriam ter ofendido a fé muçulmana; foram elas próprias, no fundo, que provocaram o massacre. Jesus pode. Maomé não pode. É isso que estão chamando de “relativismo”.
(*) José Roberto Guzzo é jornalista e colunista do Metrópoles