COLUNA VAPT-VUPT (*)
De 1986, quando houve a primeira eleição direta pós-64, até as eleições de 2024, o cidadão que tenha hoje cerca de 60 anos de idade já foi às urnas 20 vezes. No Brasil, vota-se a cada dois anos. Nesses 40 anos, o eleitor de Mato Grosso do Sul viveu eterno “erra-e-acerta” nas suas escolhas.
Nada que se compare, contudo, quando o erro está na mudança de lado ou de atitudes dos políticos eleitos. Afinal, eles estão lá porque conquistaram a confiança do eleitor durante a campanha. Apresentaram propostas, assumindo compromissos. Em troca, receberam o sufrágio de milhares de pessoas.
Quanto a isso, o eleitor de Mato Grosso do Sul pode se considerar um dos mais traídos do país. Não são conclusões de pesquisas nem se sustenta em levantamento nacional. Trata-se de constatações verificadas com base em fatos ocorridos de 2018 para cá.
O recorte sobre aquele ano é necessário porque ali surgiu o bolsonarismo, liderado pelo então deputado federal Jair Bolsonaro (RJ). O movimento foi visto como corrente capaz de romper com o velho modelo de fazer política, além de se contrapor ao petismo, que estava em vias de extinção.
O eleitor de Mato Grosso do Sul pode se considerar um dos mais traídos do país
Em 2019, o país passou a enfrentar a polarização entre bolsonarismo e petismo. As decepções dos eleitores começaram cedo em relação àqueles que se elegeram com as bandeiras da direita. Houve, evidentemente, casos e mais casos de traições aos ideais dos eleitores em todo o país.
Por aqui, as “trairagens” (linguagem que se tornou comum nas redes sociais) começaram logo no primeiro ano. A senadora Soraya Thronicke (Podemos) puxou a fila, após se eleger graças a Bolsonaro. Tudo começou quando — nas palavras do presidente Jair Bolsonaro nos debates de 2022 — ela não teve atendidos pedidos de cargos para empregar apadrinhados.
O deputado federal Loester Trutis (PL) foi o segundo “traidor”. Na disputa pelo controle do PSL na Câmara dos Deputados, Trutis se aliou ao grupo do deputado federal Luciano Bivar (União-PE) contra o também deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho número 2 do então presidente.
Além disso, o então parlamentar sul-mato-grossense envolveu-se em uma série de irregularidades, desde ao mau uso de recursos da Câmara dos Deputados à acusação de ter arquitetado o próprio atentado, comportamentos que também são uma forma de quebra de confiança.
Por aqui, as “trairagens” começaram logo no primeiro ano. A senadora Soraya Thronicke (Podemos) foi a primeira a pular fora
Quando todos achavam que já estava “bom” sobre as traições a Bolsonaro, apareceu o deputado federal Fabio Trad (PSD). Ele se opôs de forma hostil ao então presidente e a seus eleitores. Foi eleito por ampla maioria de bolsonaristas em 2018, mas perdeu a reeleição em 2022. Especula-se que Fabio possa se filiar ao PT para disputar o Governo em 2026 (ver aqui).
Quem reelegeu Marquinhos Trad prefeito em 2020 também se sentiu traído. Afinal, ele pediu mais quatro anos e ficou no cargo apenas um ano e três meses. Renunciou para disputar o Governo, quando terminou em sexto e pediu votos a Lula contra Bolsonaro. Além disso, as denúncias de crimes sexuais e desvios de recursos de obras na prefeitura são traições na sua pior forma.
Quando todos achavam que já estava “bom” sobre as traições a Bolsonaro, apareceu o deputado federal Fabio Trad
Chegam-se às eleições de 2022. O número de “traíras” só aumentou. A Soraya, Trutis e aos irmãos Trad (Fábio e Marquinhos), juntaram-se os deputados federais Beto Pereira, Geraldo Resende e Dagoberto Nogueira, todos do PSDB. Os tucanos se comportaram mais como aliados do que opositores ao Governo.
Dos três, Dagoberto Nogueira é o típico político camaleão. Em 2021, trocou o PDT pelo PSDB porque não seria reeleito se continuasse na sigla irmã do PT. Na Câmara dos Deputados, depois de reeleito, bandeou-se para a base do governo Lula. Para se eleger, Dagoberto usa os votos da direita; depois de eleito se alia à esquerda.
Mais uma eleita com o voto da direita, a ex-senadora Simone Tebet (MDB) é ministra de Lula e já declarou que irá trabalhar pela reeleição do petista. Contudo, Tebet não terá palanque para pedir votos a Lula. O espaço dela é tão reduzido quanto ao de Soraya e outros “traíras”, na linguagem das redes sociais, acrescente-se.
Para se eleger, Dagoberto usa os votos da direita; depois de eleito se alia à esquerda
As eleições de 2026 estão se aproximando. As mudanças que vierem com o novo modelo de aliança, federação, fusão ou incorporação de partidos podem deixar o eleitor ainda mais confuso.
A lista de “traíras” em Mato Grosso do Sul é extensa. Exigirá serenidade e temperança do cidadão para não repetir os mesmos erros de pleitos passados, de votar em quem dá de ombro às inquietações e aspirações populares depois de eleito. Os fatos são o guia de quem precisa fazer escolhas. E eles são bastantes.
(*) Vapt-Vupt é uma coluna do MS em Brasília com opiniões sobre determinado fato de interesse público