Por Campo Grande News
A Justiça determinou a anulação do contrato da coleta do lixo em Campo Grande, firmado entre o Consórcio CG Solurb Soluções Ambientais e a prefeitura, e estipulou a data do fim: 10 de janeiro de 2022.
O cancelamento não será imediato para dar tempo de o poder público fazer nova licitação ou assumir o serviço. A decisão é do juiz da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, David de Oliveira Gomes Filho.
O contrato nasceu em 25 de outubro de 2012, com valor global de R$ 1.827.414.324,87, e deveria ter duração de 25 anos. Os serviços são de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos.
O MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) entrou com ação para cancelar o contrato 332/2012 em março de 2018. O promotor Adriano Lobo Viana de Resende, na ação, alega que houve direcionamento licitatório, desvio de recurso público e pagamento de propina a agente público.
Na fase licitatória, segundo o promotor, um dos exemplos de direcionamento foi a exigência de entrega de garantia de R$ 5 milhões e também ter capital social de R$ 53,8 milhões. Porém, a lei de licitações prevê que se poderia exigir das participantes uma ou outra garantia, mas não as duas.
Segundo a ação judicial, também foi identificado pagamento em duplicidade por serviço. Foi incluído no contrato os custos para o tratamento dos efluentes líquidos dos aterros Dom Antônio Barbosa I e II. Porem, segundo a promotoria, o serviço já estaria incluído nas obrigações do consórcio. “Assim, o município estaria pagando duas vezes pelo mesmo serviço”.
No período de dezembro de 2012 a novembro de 2013, apenas o tratamento do chorume custou R$13.292.569,30.
Conexões
O Consórcio CG Solurb é formado pelas empresas LD Construções Ltda e Financial Construtora Industrial Ltda. Segundo as denúncias, as empresas fizeram aumento de capital “irreal e premeditado” em 2011.
A licitação foi lançada no ano seguinte. “Demonstrando que sabiam com antecedência ao próprio edital sobre as condições restritivas que seriam colocadas”, acusa a promotoria.
A Financial é de Antônio Fernando de Araújo Garcia. Enquanto a LD é de propriedade de Luciano Potrich Dolzan, casado com Ana Paula Amorim Dolzan.
Ana Paula é filha de João Amorim (dono da Proteco Construções) e sobrinha de Maria Antonieta Amorim Trad, que foi casada com o ex-prefeito Nelsinho Trad (PSD). Atual senador, Nelsinho era prefeito em 2012, quando foi firmado o contrato do lixo.
A então primeira-dama era sócia da empresa Areias Pantanal e recebeu empréstimo da sobrinha Ana Paula para pagar a compra da Fazenda Papagaio, localizada em Porto Murtinho.
“A fazenda foi paga em prestações nos anos de 2011,2012, 2013, 2014 e 2015, com pagamentos efetuados por meio de cheques e de transferências bancárias saídas da conta da Sra. Ana Paula Amorim Dolzan. A Sra. Ana Paula recebeu este dinheiro da empresa requerida LD Construções e da empresa Proteco (propriedade de João Amorim). Assim, os pagamentos feitos pela compra da Fazenda Papagaio partiram, na maioria, da conta bancária de Ana Paula, que era alimentada pelos requeridos João Amorim e Luciano Potrich”, afirma a acusação.
Cancelamento e indenização
O juiz ordenou o cancelamento do contrato a partir de 10 de janeiro de 2022. Neste período, a prefeitura pode providenciar novo processo licitatório ou assumir o serviço.
A sentença também determinou bloqueio de até R$ 94 milhões para Antônio Fernando de Araújo Garcia, Luciano Potrich Dolzan, Nelson Trad Filho, Maria Antonieta Amorim Trad e João Alberto Krampe Amorim dos Santos.
No caso das empresas CG Solurb, LD Construções e Financial, houve ordem de bloqueio no mesmo valor, porém a decisão alcança apenas bens. Os condenados também deverão pagar R$ 80 milhões em danos morais coletivos.
“Considerando que as empresas necessitam de recursos financeiros para dar continuidade aos serviços públicos concedidos pelos próximos meses, não será efetuado o bloqueio de dinheiro em suas contas bancárias, mas, fica, até lá, proibida a distribuição de lucros, dividendos, juros de capital próprio ou qualquer outro valor financeiro aos sócios”, afirma o magistrado na decisão.
Reação
O procurador-geral do município, Alexandre Ávalo, informa que não foi intimado da decisão. “Vamos tomar conhecimento e avaliar a viabilidade de recurso”, afirma.
O senador Nelsinho Trad afirma que vai recorrer da sentença. “O edital de licitação e o contrato já foram exauridos pelo Judiciário e pelo Tribunal de Contas. A licitação foi acompanhada do inicio ao fim pelo Ministério Público e pelo TCE. Além disso, é o melhor serviço de concessão pública da cidade. Disparado em relação ao saneamento básico e ao transporte público. Ocorre uma tentativa de criminalização articulada por integrantes do Ministério Público e determinados juízes”.
O ex-prefeito de Campo Grande lembra que diversos tribunais já atestaram a legalidade do contrato e que estranha vê que membros do Ministério Público, que participou de forma ativa da construção do edital, inclusive com sugestões, todas atendidas pela prefeitura, “venha questionar a lisura do procedimento”, reforça Nelson Trad Filho.
O Consórcio CG Solurb também prepara recurso para derrubar a decisão. “Isso já foi julgado uma vez pelo Tribunal de Justiça. A empresa está tranquila e como o juiz assegurou o contrato, dá tempo de o TJ reexaminar e julgar”, afirma o advogado Ary Raghiant Neto.
O Campo Grande News não conseguiu contato com a defesa dos demais citados.