POR DANTE FILHO (*)
Na semana passada, numa reportagem correta publicada pelo jornalista Eduardo Miranda, no jornal Correio do Estado, fomos dados a saber que o governador Reinaldo Azambuja teve um encontro reservado com o prefeito da Capital, Marquinhos Trad, para tratar do tema da sucessão estadual.
A informação contida no material jornalístico diz que Azambuja procurou Marquinhos para pedir apoio ao seu candidato, Eduardo Riedel. A conversa é um mistério. Mas várias versões circularam na praça. Todas meio fantasiosas.
Tem gente que jura que não foi bem assim, de acordo com informações apuradas em círculos próximos da governadoria. O que ocorreu foi o contrário: Marquinhos pediu para falar com Azambuja no escurinho do cinema para tratar de sucessão, mas a da sua, não a de outro.
Queria que o governador começasse a despejar dinheiro do Estado nos cofres da prefeitura para que ele pudesse dar andamento às obras paradas na Capital, conforme o que havia sido combinado lá atrás. Pleito justo.
O governador disse na ocasião que cumprirá a promessa, mas só depois que o prefeito definir se renunciará ou não ao mandato. Se ele permanecer no cargo, os convênios e as transferências fluirão como foi prometido; caso contrário, a vice-prefeita, Adriane Lopes, será a beneficiária do acordo entre ambos no passado, e caberá a ela – somente ela – administrar as obras de parceria em andamento.
A verdade é que o governador está convencido de que Riedel, que recolocou o Estado nos eixos, é o melhor nome para administrar o Estado.
A decisão de Azambuja tem lógica. E o seu argumento está correto, se os fatos narrados forem verdadeiros.
Se ele adiantasse os recursos a Marquinhos sinalizaria à classe política que estava fazendo um deplorável jogo duplo. Ou seja: falando uma coisa para o público e outra às escondidas. Assim, enterraria o projeto do PSDB.
E a verdade é que o governador está convencido de que o seu secretário de infra-estrutura é o melhor nome para administrar o Estado. Reinaldo deve a Riedel porque este recolocou o Estado nos eixos.
Marquinhos, neste caso, tomou um banho de água fria. Mas o que chamou a atenção de Azambuja não foi a reivindicação do prefeito, algo natural no dia a dia da política. Foi o discurso para tentar convencê-lo.
Azambuja confidenciou essa conversa para alguns amigos e deputados de seu círculo íntimo.
De acordo com as informações reservadas o governador ficou assustado com o comportamento de Marquinhos. Segundo comentários de deputados (verificados e confirmados) o prefeito ajoelhou-se aos pés do governador (literalmente) e disse que havia tido uma conversa com Deus, sendo que Este lhe havia garantido que “aquele era o seu momento”, e que ele (Marquinhos) estava predestinado, pois fora ungido pelo toque do divino para ser governador de MS.
O prefeito ajoelhou-se aos pés do governador, disse que teve conversa com Deus e que ele (Marquinhos) estava predestinado, pois fora ungido pelo toque do divino para ser governador de MS.
No primeiro momento, Azambuja pensou tratar-se de uma brincadeira, mas ao longo da conversa percebeu que o prefeito estava falando sério, em transe, com as mãos contritas, assegurando que se o governador negasse a vontade de Deus queimaria no inferno.
Perplexo, Reinaldo baixou a cabeça, olhou para o chão, e esperou que o prefeito saísse do surto, acalmou o ambiente, e disse que iria pensar em tudo aquilo. Ficou convencido naquele momento que Marquinhos não terá condições psicológicas para assumir a governadoria.
Meses atrás, em dezembro do ano passado, o mesmo havia ocorrido, desta vez com Zeca do PT. Num encontro, o líder petista ouviu de Marquinhos a mesma litania da unção deísta, com relato de detalhes do diálogo místico que ele (o prefeito) vinha mantendo com Deus.
Zeca saiu do encontro e comentou com o deputado Vander Loubet que Marquinhos “estava ficando louco” e comunicou ao partido que as conversas entre ambos estavam encerradas. “O cara está com as bielas soltas”, afirmou.
O jornalista Antônio João Hugo Rodrigues ironizou o comportamento do prefeito que o faz transitar entre a política e a religião, seguindo caminhos insondáveis do delírio místico.
Recentemente, o jornalista Antônio João Hugo Rodrigues, numa live que ganhou boa repercussão nas redes sociais, ironizou, com certa ênfase, o comportamento do prefeito neste campo etéreo que o faz transitar entre a política e a religião, seguindo caminhos insondáveis do delírio místico.
Antonio João tem uma maneira peculiar de se comunicar, que transforma fatos sérios em quase-piada. Ele é amigo próximo do Senador Nelson Trad Filho, o que faz qualquer pessoa depreender de que ele sabe do que está falando.
Nesta aparição (que pode ser vista no facebook), ele encerra seu comentário assegurando que o prefeito “está piradinho”, também manifestando sua preocupação com a administração do Estado caso Trad seja eleito.
Nos bastidores da política a preocupação com a saúde psíquica de Marquinhos está posta.
Diante destes fatos, que tem sido tratados pela imprensa de Mato Grosso do Sul com certa cautela e muito mais zelo do que seria aceitável, entendo que a pauta não é trivial. O prefeito que, normalmente, é uma figura cordata, paciente e aberto para conviver com a diversidade, só que em alguns momentos parece perder o controle sobre as coisas terrenas e ingressar na área nebulosa do misticismo primitivo. Existem inúmeros vídeos gravados por ele próprio mostrando isso, sobre vários temas.
Marquinhos, pelo visto, precisa dialogar mais com sua psiquê e, quem sabe, com algum psiquiatra. A classe política já formou seu juízo.
Quem conhece de perto o assunto sabe da ocorrência de surtos que acomete pessoas em momentos de crise e alta tensão.
Marquinhos, pelo visto, precisa dialogar mais com sua psiquê e, quem sabe, com algum psiquiatra. A classe política já formou seu juízo.
O próprio secretário Antônio Lacerda recentemente deu essa dica, assombrando a assessoria do prefeito, ironizando as idas e vindas sobre o “vou-não-vou” da renúncia. Muita gente estranhou, mas Lacerda não explicou. É compreensível.
Nos últimos tempos, os brasileiros têm visto o mesmo acontecer com Bolsonaro em outro diapasão quando ele fala em “governo de Deus”, no qual diz acreditar piamente que está ungido pela clava forte do espírito santo para continuar na presidência da República. Mas este é um caso perdido.
Ninguém é contra rezas, orações, sincretismos afro-brasileiros, mas nunca deu certo colocar Deus no meio das pactuações institucionais da vida terrena e democrática.
Acredito ser temeroso fugir do assunto – diante dos acontecimentos auríferos com repasses de sacolas de dinheiro no Ministério da Educação – quando se vê toda essa transa mantida entre políticos e pastores transformando cultos em palanques eleitoreiros, enfiando a esfera do sagrado e os livros da fé no valhacouto das coisas mundanas, pois sabemos onde isso vai acabar.
Marquinhos vai nessa senda e acho que vai se dar mal.
Ninguém é contra rezas, orações, sincretismos afro-brasileiros etc, mas nunca deu certo colocar Deus ou seja lá que divindade for no meio das pactuações institucionais da vida terrena e democrática.
Em nome da seriedade e do bom senso convém tirar os joelhos do chão e agir com racionalidade na hora de olhar nos olhos do povo.
(*) Dante Filho é jornalista e escritor. Atua há 38 anos na imprensa sul-mato-grossense. Artigo publicado originalmente na página do autor sob o título “Marquinhos precisa dialogar mais com sua psiquê e menos com a classe política”.