CAMPO GRANDE
Candidata a deputada estadual em Mato Grosso do Sul, a brasiliense Raquelle Lisboa Alves (PL), 27 anos, utiliza entidade fictícia para inflar seu currículo na área social, induzindo o eleitor a fazer sua escolha com base em um suposto trabalho desenvolvido a famílias especiais.
Raquelle é esposa do deputado federal Loester Trutis (PL), que responde a processo no Supremo Tribunal Federal acusado de ter forjado o próprio atentado, em fevereiro de 2020. A denúncia da Procuradoria-Geral da República foi recebida pelo STF por 11 a 0.
No site da candidata, registrado no Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul (TRE-MS), consta que Raquelle fundou, em 24 de agosto de 2020, o Centro de Triagem de Atendimento de Famílias Especiais, sigla grafada ora como CETAFE, ora como CTAFE. Segundo a notícia, a entidade faz trabalho de “atendimento, acolhimento e acompanhamento das famílias”.
Com base em denúncias recebidas, o MS em Brasília apurou que a entidade não existe, nem física nem formalmente. Nunca prestou qualquer atendimento. Não tem CNPJ nem registro no cadastro nacional de entidades de assistência social. “Pior de tudo é que ela (Raquelle) usa indevidamente pessoas com deficiência para se promover”, resume um dos denunciantes.
A instituição fictícia, segundo denúncias, foi ideia de Raquelle, do marido Loester Trutis e do ex-chefe de gabinete do deputado em Brasília Ciro Nogueira Fidélis, que responde pelos mesmos crimes de Trutis sobre o atentado fake.
O objetivo, à época, era emplacar a moça candidata a vice-prefeita em Campo Grande em uma das chapas concorrentes.
Exclusão de matéria
A suposta entidade para “famílias especiais” também é citada em reportagem divulgada em 10 de setembro pelo site www.dicamstv.com.
“Raquelle se tornou ainda mais conhecida no Estado pelo trabalho de apoio e defesa do direito das pessoas com deficiência, idealizando o Centro de Triagem de Atendimento de Famílias Especiais (CTAFE)”, diz trecho da matéria.
“Em razão dessa forte atuação, a advogada Raquelle Trutis tem sido requisitada em todo o Estado e visitou todos os municípios”, acrescenta o Dica MS TV.
Algumas denúncias foram encaminhadas para o site que divulgou a fake news, o que resultou na exclusão imediata do conteúdo supostamente falso. No entanto, denunciantes fizeram prints do material publicado.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, os candidatos que propagarem notícias falsas durante as eleições terão o registro de candidatura cassado.
A candidata Raquelle Lisboa foi procurada ontem (20), às 14h23, por e-mail e pelas redes sociais para explicar o uso de entidade fictícia para obter vantagens eleitorais, mas não houve resposta até o fechamento desta matéria.
De assessora à esposa
Não é a primeira vez que Raquelle Lisboa usa informações falsas para se promover. Em julho deste ano, o MS em Brasília denunciou que a mulher de Trutis se apresentava nos municípios como detentora de cargo pomposo, o de coordenadora de projetos do Governo federal, o que era falso (ver aqui).
Natural de Brasília, Raquelle Lisboa Alves foi contratada em maio de 2019 para o gabinete do deputado Loester Trutis em Brasília. Em poucos meses, ela teve o salário reajustado e passou, inclusive, a viajar com o parlamentar.
Em meados de 2020, a assessora se mudou para Campo Grande, onde passou a morar na casa da mãe de Trutis, na Vila Carlota. O imóvel foi reformado para receber a nova hóspede e abrigar o novo casal.
Na época, contudo, o deputado ainda morava com os três filhos e a esposa, a veterinária Reni Melo, em uma casa no Bairro Vilas Boas. O aluguel, conforme apurado pelo MS em Brasília em janeiro de 2021 (ver aqui), era pago com a verba indenizatória da Câmara dos Deputados, prática considerada gravíssima.
Tanto que um dos endereços onde a Polícia Federal fez busca e apreensão, como parte da Operação Tracker desencadeada em novembro de 2020 para investigar o suposto atentado contra Loester Trutis, foi a casa onde o deputado morava com a família.
Mesmo casado, Trutis viajou com Raquelle para a Itália, onde o deputado teria ido em “missão oficial” pela Câmara dos Deputados. A então assessora não teve os dias descontados, já que parte da viagem ocorreu durante a semana, embora ela tenha se ausentado do país por ao menos três dias.